1.4.08

DE REPENTE, O SOL

Fugindo do caos que se instalou em minha morada, em vez de me juntar à multidão, escolho subir e olhar de longe. Rachaduras, mofos... infiltrações guardam sofrimentos antigos que me afetam os pulmões já debilitados pela poeira que me faço ser. Subo, encolhendo-me o mais que posso para não perturbar a harmonia que há no caminho entre pedras, árvores, vento...caminho.

Em busca de oxigenação nos pensamentos que me são confusos, continuo e percebo que para usufruir das maravilhas, o caminhar exige, de mim, uma nova postura. Para receber o que procuro, preciso dizer, sem palavras e de forma clara, o que quero. No corpo cansado, habito um ser rígido, sofrido, cabisbaixo, murcho ...Mas o universo conspira e exige: para atingir o topo é preciso leveza e altivez...

Entre pedras, árvores e água, na tarde fria de outono, distante 154 metros, contemplo a Vila em seu dia de festa. Observo a imensidão - água, árvores e multidão que, aos pés da montanha, oferecem-se em cantos e encantos que para mim parecem não fazer sentido. Na aridez, parece que só o vazio impera.

Do alto, quero afastar a inveja que sinto dessa tríade que parece respirar alegria. Do alto, grito que meu desejo é oxigenar os pensamentos confusos. Do alto, grito que preciso e quero leveza nos pulmões... respirar, inspirar...expirar...viver. Do alto, sinto o ar gelado na tarde nublada, suavizando as vias aéreas, atravessando minhas roupas e penetrando-me pelos poros dando-me novo ritmo no olhar para a água, árvores e multidão. E me sinto ar...

De repente, o sol que se recolhera o dia inteiro aponta um raio que ilumina meu campo de visão. E vejo o mar, a mata e as pessoas. Terá esse raio de sol algum sentido ou será apenas um raio de sol no fim da tarde? Cruz credo! Para quê entender o significado e não apenas sentir.

O afastamento foi bom. Agora preciso fazer o caminho que me leva ao meu encontro, e, com o sopro de vida que recebi, enfrentar o caos da minha morada, que carece de cuidados que a farão ressurgir renovada, limpa, arejada, mantendo a essência do que sou, entre pedras, árvores e água da fina chuva que cai, agora descendo, querendo entender-me nessa tarde fria de outono em que o sol apareceu às 05 da tarde...

32 comentários:

Anônimo disse...

o outono e seu ciclo de cores, de transformações, de luz...a vida respira quando as folhas de plátanos voam e buscam novos lugares. gostei muito do texto. abraços.

Ilaine disse...

Jacinta!

Simplesmente lindo este texto, menina. Escreves muito, muito bem. Parabéns!

Beijo no coração.

layla lauar disse...

Nossa! Tem que ser muito poeta, para transformar uma casa com mofo e rachaduras em pura poesia.

Bendita inspiração!

Amei!

beijos todos e uma admiração deste tamanho!

Dauri Batisti disse...

Apesar do tom melancólico do texto você foi à FESTA. Isto diz tudo. Sempre há chances do sol aparecer, nem que seja às cinco da tarde.Tudo de bom.

Anônimo disse...

Que delícia, eu senti cada ida, cada volta, cada olhar. Essa chuva faz tempo que não cai aqui, preciso do frio de outono. Cadê?

Beijos!

Poetisa da Alma disse...

Cada dia uma nova chance e oportunidade de fazermos diferente e sermos felizes!
A vida é um aprendizado...
Aprendemos tanto com amor como com a dor!
Suas palavras tocaram minha alma!
Um beijo carinhoso

Anônimo disse...

O outono proporcionando palavras lindas que transformam a tempestade em leves brisas primaveris que serão sentidas logo após o duro inverno que enfrentarás no caos da tua morada.

Abraço, Jacinta.

Elcio Tuiribepi disse...

Nossa! Muito legal, você conseguiu passar a impressaõ de se olhar para dentro observando a própria vida e os valores também de cada instante, quanto a minha lá, vc não deixa de ter razão...é uma mudança mesmo interior...um abraço e um beijo na alma...boa quarta para vc...

Lunna Guedes disse...

O que eu mais gosto no outono é justamente essa possibilidade de espiar a nós mesmos porque essa estação é como disse Drummmond "é uma estação mais da alma que do coração".
Abraços meus

Luciana Cecchini disse...

"Para que entender o significado e não apenas sentir"

O sentir é o caminho da verdade. A nossa verdade,aquela que nos mantem vivos, respirando, amando, sendo, florescendo...

Bjo,

Luci:)))

Plinio Uhl disse...

ei, jacinta.

desculpe o sumiço. a prova foi no último dom, em pleno dia de festa, rs.

o sol despontando quase na hora de se pôr, o mar, a mata e as pessoas... adorei a vista que seu texto me proporcionou. inspira a ajeitar as coisas do lado de dentro :-)

Beijos

Maria Maria disse...

Desculpe-me a invas�o. Visitei-te pelas brechas do balaio vermelho e vi esse belo verso de sua prosa "escolho subir e olhar de longe..." Os poetas s�o desse jeito. Sauda�es po�ticas, Maria Maria

Luis Eustáquio Soares disse...

belo texto, amiga, já arejado e oxigenado, com o sol da manhã nascendo às da tarde. valeu a leitura.
b
luis

Anônimo disse...

andei sumido, ams agora... voltei!! sabe como é... estudos...

Anônimo disse...

"Para receber o que procuro, preciso dizer, sem palavras e de forma clara, o que quero."
Estas palavras encerram muitos dizerem, Jacinta! Amei este texto... me colocou diretamente em contato com a natureza de Deus e a minha natureza pessoal.
Um beijo.

PS: tem presente pra tu no meu blog. ;)

Anônimo disse...

A melhor coisa que se pode fazer é não olhar para trás.Aliás quem olha pra trás vira estátua de sal.

Carmim disse...

Tem dias em que o sol não aparece, mas isso não significa que ele não esteja lá, atrás das nuvens, pronto a dar um ar da sua graça na primeira oportunidade.
Só não devemos trancar as janelas da nossa alma, para que assim ele nos encontre, nós o encontremos, e nos encontremos!

Beijo.

Marcelo disse...

Me parece um renascimento o que passou.
Por isso que é sempre bom deixar as janelas abertas para o sol entrar, assim não mofamos =)

Beijinhos.

Francisco Sobreira disse...

Jacinta,
Um belo e forte relato. Senti, nele, a presença de um certo realismo fantástico. Gostei. Um grande abraço.

Paulo Vilmar disse...

JAcinta!
há o Outono!
Adoro este jardim...
Beijos!

Adriano Caroso disse...

Já sinto o que dizem as suas palavras,
Peço apenas,já sinta o que quero dizer.
As águas das chuvas,
Descem como as lavas,
Que queimam e destroem,
Mas fazem o novo,
De novo na terra, enfim florescer.
Já sinto no peito o singelo da alma,
Já sinta nas linhas o meu parecer.
Já sinto Jacinta, o que você sente.
Já sinto na mente o queres dizer!

vieira calado disse...

Obrigado pelas palavras deixadas no meu blog de poesia.
Bom fim de semana.

Nanda Nascimento disse...

...mergulhar neste mar de sensações
e se completar sem perder sua essência.

Um ótimo final de semana!!

Beijos e flores!!

benechaves disse...

Oi, amiga: um texto que diz de sua beleza e que foge ao lugar comum. E o sol aparecer às 5 da tarde é uma raridade, não?

Um beijo com lua...

Opuntia disse...

Oxigenação e textos lindos como esse. Precisamos disso p/ viver.

Bjos!

Moacy Cirne disse...

De repente, o texto. De repente, o olhar. De repente, a fuga. De repente, a tarde fria de outuno. De repente, um beijo.

John Doe disse...

as vezes me pergunto onde vou se tudo que vejo é caos... e quando o sol chega conto os dias pro frio voltar e me acolher...

Friendlyone disse...

Tirou toda a poeira?


Bom dar um tempo pra cabeça e se dar a chance de ver diferente. O sol faz bem... me remete à vida.

Há braços.
Friendlyone.

Beto Mathos disse...

O encontrar-se consigo...
Gostei!

Célia de Lima disse...

De repente, poetisa, nesse momento que te leio, posso ter encontado um raio de sol. Coisa mais linda! Sempre minha admiração. Beijos, Jacinta, bom fim de semana!:-)

Josely Bittencourt disse...

É mesmo, o universo conspira pela leveza...

Bijos

Anônimo disse...

Quase sentindo o eterno reflorescer da orquídea, que busca o alto, a luz, o sol, mesmo que este tenha se escondido por trás das nuvens por alguns momentos...

beijos, carinho.