23.11.08

TEMPO TEMPO TEMPO

Tempo de mais água na cidade em que as saídas estão ocupadas pela ignorância e prepotência de se fazer da rua a lixeira particular de cada um. Tempo de ficar quietinho, entocado entre as paredes; dois dias de gula e preguiça alternando com preguiça e gula. Ausento-me do mundo, sonho com um banquete, Meu Deus! E, eu, comendo o tempo nos espaços que me marcam. Que venha o sol oxigenar minha expressão cansada do tempo fechado, aprofundando a cicatriz que recebi na menina que fui, em constante ameaça de ir embora, antes do tempo, numa onda de infortúnios infantis. Quanto tempo de promessas de mãe para assegurar-me a vida! o sarampo já havia levado Maria de Fátima e Francisco, e eu, teimava em continuar bem que o Franciscano avisou para não colocar esse nome na menina – mas, era promessa a N.Senhora de Fátima. A Lucia, a mais velha, crescia forte, como forte é, até hoje, na tranqüilidade e generosidade com que se aceita e leva a vida do melhor jeito que pode. E, voltando ao tempo, o dermatologista lança seu olhar botox sobre minha face e quer saber a quanto tempo carrego a marca que separa minhas grossas sobrancelhas. Ainda resisto a ele. Receio a artificialidade do sorriso, em tempos perdidos que entopem o coração de expectativas – cárcere das emoções – aonde se escondem sentimentos que precisam se expandir em sorrisos, que exercitem os músculos do diafragma, e me encha de fôlego para partilhar a alegria. Alegria de saber, um dia, que toda água faz seu curso normal, abençoando a terra, sem ficar represada no tempo dos que não vêm retorno no investimento subterrâneo.

26 comentários:

Carla disse...

Lindo, Jacinta! Esses dias chuvosos nos causam uma certa nostalgia. Não entendo por que gosto disso, mas gosto.

Bjosss

Anônimo disse...

Chuva na vidraça, pipoca pipocando no micro , me lembro do tempo que para elas pipocarem minha mãe batia na tampa da panela e resmnungava "Maria sororóca, arrebenta a pipoca".
Domingo é dia de reminiscências e lembranças.
Voltei no tempo lendo teu texto.

Dauri Batisti disse...

Tempo de retirar cicatriz,
tempo bom,
chuva esperada.
Tempo de ficar quietinho,
tempo ninho,
que espere o mundo.
Tempo de águas,
macias, escorrendo
molhando,
preparando o jardim
para o sol.
Ele vem...

anjobaldio disse...

Muito bom. Obrigado pela visita. Voltarei mais vezes também. Grande abraço.

Cores, Letras e Notas disse...

voltando a tempo de uns respingos decantados no rosto e uma brisa de nostalgia, mas de mudança tambem... let's rain...rs
abs
Celso

ex-controlador de tráfego aéreo disse...

Oi Jacinta!

Uma cicatriz é marca de vida.
Que esse sol apareça logo e brilhe intensamente sobre você.

Água também é muita vida, sempre foi, toda a vida.

Um beijo com carinho, moça!!!

Osvaldo disse...

Oi, Jacinta;
Tempo para dizer que você além de bem escrever pega seu tempo para realçar e valorizar esse mesmo tempo...
Esta "Crónica do Tempo" mostra que é do tempo e ao tempo a quem pertencemos. Quando não nos motivamos, não fazemos ou realizamos porque achamos que não temos tempo, mas se quizermos conquistar o Mundo então nos aliamos ao tempo e com essa aliança temos tempo para tudo... Que chova ou faça sol.
Mas por mais tempo que tenhamos, sempre nos faltará tempo para vencermos o tempo.
bjs pra Jacinta e pra Vila Velha.

meus instantes e momentos disse...

Muito bonito e bem escrito.
Muito bom.
Maurizio

D.Ramírez disse...

Texto maravilhoso e muito bem escrito, me prendeu e me fez bem lendo. Muito bom mesmo!!
BEsitos

Vera Basile disse...

Oi Jacinta!!
Gostei demais desse seu texto! Deixei um presentinho lá no seu e-mail!! Espero q goste!
Bjs

Josely Bittencourt disse...

Essa noite sonhei q estava no centro de Vitória, caminhava suando, uma delícia de calor! Não me atrai dias de chuva e frio, marcas retonam impregnadas, infiltradas pelo clima úmido. É um saco isso. O lado bom da chuva já passou nos dois primeiros dias.

Adorei o texto.

beijoca

lula eurico disse...

Muito bom, muito bom, mesmo!
Apesar de termos de trabalhar esses doridos temas...é preciso escrever sobre eles. É urgente!
Abraçamigo.
E breve faço nova postagem.
Sou mesmo uma velha tartaruga... rsrsrs

Germano Viana Xavier disse...

Eu ainda sou do tempo de se preferir ter "bens simbólicos", Jacinta, como diria o Bourdieu.

As coisas da alma ainda são, deveras, os melhor prêmios.

Um carinho.
Continuemos...

Germano Viana Xavier disse...

"melhores"

...

São disse...

As fotos( a de cima e a de baixo) estão lindas.
E quando deixaremos de ser prepotentes e aprender que a Terra, o Ar, a Luz e a Água sõ de todas as pessoas e que todas as pessoas são iguais perante Deus?!
Boa semana.

Letícia disse...

Jacinta,

Lembro de seu blog e nem me pergunte porquê sumi. Nem eu sei. Eu era alice do Cosmic Library e vc lia sempre e eu tb vinha por aqui. Mas o tempo, como a água, vai levando a gente em outra direção. Mas voltei.

Bjs.

Alice disse...

Lindo demais !!


bjkas no seu coração

Ruberto Palazo disse...

Uauuu....
Chuva, agua represada, loucuras do tempo. Muitas vezes esperamos, esperamos e esperamos aguardando o momento certo, dando tempo ao tempo, e o tempo simplesmente vai... como vc mesma disse, muitas vezes devemos deixar a agua fluir e colher o que plantamos no subterraneo.

Beijos

Anônimo disse...

Tempo das águas é o tempo de brotar as sementes. Tomara fosse apenas tempo das rebentações de vida, né? Mas a nossa mão nem sempre é racional!
Beijo!

Anônimo disse...

Um texto de lembranças, de ternura e de queixas, entremeado com tua bela poesia.

guru martins disse...

... heheheh...
muito bom,
mas se precisar
dar uma geral,
tiver o recurso
e a certeza da
competência
do feitor, faça.
Isso também pode ajudar
a manter a visão do mundo
e a sensação de fluxo da existência mais apurados,
tão necessários ao bardo...

um bj de incentivo

Katia De Carli disse...

Oi Amiga

Já vejo um tímido raio de sol pela fresta da minha janela... porém sigo como hamburguer na chapa... ainda bem que minha ajudante hoje recolheu as migalhas das comidinhas na cama dos dias de retiro forçado.
Agora meu quintal cismou em brotar água! hahahahaha mas é sério, tem água brotando na quina da calçada, acho que é alguma nascente aterrada que resolvu renascer.
Gostei da história, com botox e tudo...
beijinho

Oliver Pickwick disse...

Reinventaste o dia chuvoso em uma prosa repleta de poesia.
Um beijo!

Amarísio Araújo disse...

Belíssimo o seu texto,Jacinta.
Lembrei-me da poesia 'Ah! Os relógios' do Mário Quintana:

"(...)Porque o tempo é uma invenção
da morte
não o conhece a vida -a verdadeira-
em que basta um momento de poesia
para nos dar a eternidade inteira
(...)"

Você escreve maravilhosamente bem.
Tenha uma noite linda,cheia de bons sonhos.
Amarísio

Dauri Batisti disse...

Voltei aqui para agradecer o belo comentário que você deixou no ESSAPALAVRA.

Beijo.

João Neto disse...

Olá Jacinta,

Obrigado pela visita.

Hoje vim apenas agradecer a visita, ando um bocado ocupado estes dias...
Em breve retorno com mais tempo para te ler.

Abraços, volte sempre ao café.